terça-feira, 25 de janeiro de 2011

VERANEIOS EM GENIPABU

AINDA SOBRE A PERDA DA PAZ

Amanheci pensando em Genipabu e nesta manhã chuvosa isso me trouxe uma certa melancolia. Chuvas de janeiro, trazem-me sempre Genipabu à memória. Uma goteira recém-vazada em meu quarto no chuvoso janeiro de 2011 levou-me veloz e atônito aos verões de 1984 e 1985 e ao abrigo quase precário de telhas vermelhas bolorentas que filtrava respingos suaves e espaçados que se estatelavam em meu rosto bronzeado. Mais queimado que bronzeado, que naquela época protetor solar era apenas uma novidade afetada. Naqueles meados da década de oitenta, passei janeiros e carnavais lá, numa casa muito simples, à beira-mar, que meu avô alugava. Ficava a três casas da casa de Carlinhos Suassuna, que era o centro do mundo ensolarado e irresponsável. O dia todo saracoteando de uma casa para outra, banhos de mar no pé do “encoqueirado” morro ao final da tarde e, à noite, sempre uma festa, em casa apressadamente definida. O interessante – e em retrospectiva, triste – é que andávamos quilômetros para chegar aos arrastas. Às vezes, as festinhas eram do outro lado de Genipabu, perto do rio, e íamos andando. Dois a dois ou em pequenos grupos. As meninas também. Por vezes, a sorte de uma carona pendurada num indefectível “Selvagem”. Ficávamos lá dançando, esperando angustiadas horas para chamar uma menina para dançar – às vezes a festa sucumbia antes da coragem se manifestar –, já tomávamos os primeiros goles de batida e, ao final, nas primeiras horas da madrugada, voltávamos pelo mesmo caminho, a pé, na escuridão total ou na escuridão rasgada por tíbios fachos de lanterna. Não era incomum um casal, com incontrolável tesão adolescente, voltar sinuosamente pela areia branca.
Nem o mais rico dos meninos de hoje vai ter isso (Aliás, estes é que não vão ter mesmo). Não se caminha mais inocentemente pela praia, durante a madrugada.
Já sei o que me trouxe Genipabu à memória hoje. Tenho ouvido com muita pena que os veraneios hoje só são possíveis com jagunços. A leveza, o desprendimento, a atmosfera de liberdade das temporadas de praia é estuprada por homens armados até os dentes e preparados para reagir. O pior é que a imbecilidade já transformou os jagunços em sinais exteriores de riqueza: “Na minha festa ontem, havia dois seguranças do BOPE”; “Na minha casa, tenho 4 seguranças se revezando em turnos contínuos”; “No meu condomínio, são oito homens”. A imbecilidade sempre encontra seu jeito de ver vantagem onde só existe o fracasso, a perda e a violência em estado puro ou latente.
Eu, claro, gostaria de sentir os respingos de chuva por entre as telhas.
Ricardo Alcântara.

Nenhum comentário:

Postar um comentário